sexta-feira, 19 de outubro de 2012

De bradar aos céus artigo de opinião de Jorge Cordeiro Jornal Avante!

As declarações do presidente da conferência episcopal terão sido recebidas mesmo em círculos da Igreja católica entre um misto de perplexidade e desilusão. Esperar-se-ia que perante o rosário de exploração, desemprego e destruição da vida de milhares de portugueses que a política do Governo e o pacto de agressão estão a semear no País, as palavras do mais alto cargo da Igreja se juntasse aos que não aceitam uma vida marcada pela injustiça e as desigualdades. Assim não foi. As palavras de Policarpo, apelando à resignada aceitação do rumo de um empobrecimento generalizado dos portugueses construído à custa da usura e opulência dos poderosos, não podem deixar de ser recebidas com uma imensa frustração por muitos milhares de católicos que não só aspiram a uma vida melhor como agem em defesa da dignidade e de uma justiça social que inscreveram como seus valores. Frustração seguramente ampliada quando a um inaceitável apelo ao conformismo perante as injustiças se juntam palavras de apoio e infundada esperança numa política que conduz o País para o declínio e a vida dos trabalhadores e do povo para o inferno.
Disse Policarpo que «não se resolve nada contestando». Ao contrário do que afirma, é justamente por saberem que é lutando em defesa dos direitos de cada um, elevando a voz contra a exploração e dando expressão ao protesto perante o roubo dos seus rendimentos, que centenas de milhares de portugueses, talvez na sua maioria católicos, não só não se calam como exigem o fim desta política de desastre. Ninguém porá em dúvida nem os fundamentos teológicos nem o conhecimento das escrituras por parte de Policarpo. Mas compreender-se-á que não se aceitando a invocação em vão, e erradamente, do texto constitucional se lhe recorde que a Constituição da República consagra não só o direito à indignação e ao protesto como o inscreve como um valor. Compreende-se assim a amargura que percorrerá o coração de muitos católicos que julgavam ver no topo daquela Igreja que têm como sua, uma voz inconformada contra as desigualdades e a pobreza e um espaço onde se inscreva, mais que uma respeitável função de caridade, a insubstituível dignidade que a todos é devida.

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