PSD e CDS-PP chumbaram o diploma do PCP que propunha a revogação do decreto governamental que suspende as reformas antecipadas. Inalterada, por ora, fica esta medida injusta e gravosa de um Governo obcecado em atacar o mundo do trabalho com a mesma intensidade com que protege os grupos económicos.
Iniciativas idênticas do PS e do BE visando o mesmo objectivo tiveram igual desfecho sexta-feira passada, depois de o assunto ter dominado na véspera a agenda plenária num debate onde o presidente do Grupo Parlamentar do PCP contestou a decisão «brusca e sem aviso» do Governo de eliminar a possibilidade de recurso às reformas antecipadas.
Decisão surgida no contexto de uma grave crise económica e social marcada pelo desemprego, os baixos salários, os salários em atraso e o baixo rendimento das famílias, a par do aumento brutal do custo de vida e dos bens essenciais.
Foi para esta realidade preocupante que Bernardino Soares chamou a atenção, pondo em relevo o facto de ser neste preciso quadro social que o Governo decide «atacar em todas as direcções». São disso testemunho, exemplificou, o corte no acesso ao subsídio de desemprego, o roubo nos salários e subsídios aos reformados e aos trabalhadores da administração pública.
A alteração em curso ao código de trabalho foi também apontada como mais uma malfeitoria deste Governo cujo objectivo, segundo o líder parlamentar comunista, é permitir o despedimento ainda mais fácil e barato, para cortar para metade o valor das horas extraordinárias.
Mudar as regras
Ora é neste âmbito que surge esta mais recente medida do Governo, com incidência «especialmente gravosa em duas situações particulares»: por um lado, as longas carreiras contributivas, ou seja a situação daquelas pessoas que já descontaram mais de 40 anos e que agora são obrigadas a trabalhar 45 ou 50 anos sem qualquer acréscimo para a sua reforma; por outro lado, a situação de trabalhadores que tomaram decisões recentes no pressuposto de que lhes dariam acesso à reforma antecipada e que, agora, de um momento para o outro, «ficam em muitos casos sem salário, sem subsídio e sem reforma, porque a ela não têm acesso».
Não por acaso, a nenhuma destas situações de gritante injustiça aludiu no decurso do debate o ministro da Solidariedade e Segurança Social,.
Pedro Mota Soares, aliás, nas suas intervenções, o que fez foi procurar justificar a medida do Governo dizendo que se destina a «assegurar a sustentabilidade da Segurança Social», repetindo, por outra parte, que a sua aprovação em segredo foi para evitar uma corrida às reformas antecipadas. E afirmou que em 2005 o PS «fez o mesmo e achou então a medida justa».
O que levou o deputado do PS Miguel Laranjeiro a negar semelhanças, dizendo que o Governo do seu partido tomara igual medida mas «às claras», em «diálogo com os parceiros sociais», enquanto o actual Governo o fizera «à socapa». Confirmou, assim, com singela clareza, que a separar PS e PSD nesta matéria não está a substância da medida – o seu conteúdo – mas apenas a forma como a mesma foi executada.
Governo hipócrita
Já Bernardino Soares foi à questão de fundo para contestar abertamente o argumento da defesa da sustentabilidade da Segurança Social invocado pelo Governo. Argumentação que classificou de hipócrita, porquanto, acusou, este é afinal o mesmo Governo que «executa uma política económica que ao causar recessão e desemprego está a constituir-se no principal obstáculo a uma melhor sustentabilidade da Segurança Social».
Mais, é o mesmo Governo que tem «uma política perdulária em matéria de dívidas à Segurança Social» (mais de sete mil milhões de euros no final de 2010), o mesmo Governo que «aposta em deitar fora da Segurança Social pública para entregar ao sector financeiro privado os descontos dos salários mais altos».
Pela base caiu ainda a alegação do Governo de que esta medida permite uma poupança de 450 milhões. São outras as contas do PCP, com Bernardino Soares a contrapor no debate que esse é exactamente o valor do aval que o Estado deu ao BPP – «o banco das grandes fortunas», assim o apelidou – e que foi executado por falta de pagamento deste banco.
Ou seja, concluiu, houve dinheiro para pagar às fortunas do BPP mas, agora, o Governo quer compensar esse pagamento «retirando aos trabalhadores o direito que tinham até aqui de se reformar antecipadamente».