Quem se lembra das palavras do então deputado do PSD Paulo Rangel sobre a claustrofobia democrática lê o Despacho do Ministro das Finanças e não acredita.
Como é possível numa democracia que um Governo sequestre o Estado, paralize serviços e tome como reféns as vidas de milhões de portugueses deixando-as suspensas de uma decisão do agora todo-poderoso Ministro das Finanças?
Como é possível numa democracia que um Governo que propôs e aprovou um Orçamento do Estado inconstitucional se vingue de si próprio sobre o seu povo, deixando escolas, hospitais, serviços da segurança social, centros de saúde, forças de segurança, inspecções e tribunais paralizados nas respostas que devem dar aos cidadãos que deles necessitam?
A resposta é dura mas óbvia: obviamente que nada disto é admissível numa democracia e deixou de ser admitido pela Constituição que entrou em vigor em 1976!
O Despacho do Ministro das Finanças fala em “sérias dificuldades no cumprimento dos objectivos a que Portugal está internacionalamente vinculado e das metas orçamentais que tem de cumprir” procurando responsabilizar o Tribunal Constitucional pelo Orçamento inconstitucional aprovado por PSD e CDS e justificar o controlo unipessoal de toda a despesa do Estado.
Pergunta-se: onde estiveram essas preocupações quando em 2012, por inteira e exclusiva responsabilidade do Governo e da maioria PSD/CDS, não foram cumpridas as metas orçamentais? Onde estão essas preocupações de cada vez que se constata o incumprimento dos objectivos em relação ao desemprego? Onde estão essas preocupações de cada vez que se constata o agravamento da recessão económica apesar de os recursos nacionais continuarem a esvair-se para o buraco sem fim criado pela especulação financeira?
O Governo fala do prejuízo para a credibilidade externa do país na sequência da decisão do tribunal Constitucional e na necessidade de tomar medidas para reconquistar tal credibilidade.
Pergunta-se: o que prejudica a credibilidade do país são as decisões dos tribunais que fazem cumprir as leis e a Constituição ou é termos um Governo que em dois anos consecutivos aprova Orçamentos inconstitucionais?
O que prejudica a credibilidade externa do país é termos um Governo vinculado ao cumprimento da Constituição ou é termos um Estado sequestrado pelo Governo?
Afirma ainda o Governo que é necessário adoptar “medidas que reforcem o controlo da execução orçamental e consequentemente de contenção da despesas do sector público”.
Pergunta-se: porque não tem o Governo estas preocupações de contenção da despesa cada vez que se trata de pagar juros usurários aos agiotas e especuladores que sugam os impostos dos portugueses? Porque não tem o Governo estas preocupações de controlo da despesa quando se trata de enterrar mais e mais dinheiro no buraco do BPN ou na recapitalização da banca?
O Governo afirma que o Despacho é transitório e que não tem os efeitos que se lhe atribuem mas não só o Despacho não tem data de validade como os seus efeitos já se vão fazendo sentir por todo o país e em todos os serviços do Estado.
Senhora Presidente,
Senhoras e senhores Deputados,
Senhores membros do Governo,
Quando se constituiu o Governo vendeu-se a ilusão de que vinha aí um Ministro das Finanças extraordinário, porque Vitor Gaspar era um técnico e não um político, como se um ministro pudesse tomar decisões técnicas sem fazer opções políticas.
Afinal, Vitor Gaspar “O técnico” já não se contenta sequer em ser reconhecido pelo Primeiro-Ministro como o político número 2 deste Governo. Vitor Gaspar quer agora concentrar em si todos os poderes, mandar em todos os ministérios e ministros e em todos os serviços do Estado.
E alguém tem que dizer a este Ministro e a este Governo que a isto já Portugal assistiu na década de 30 do século passado.
Que não haja ilusões.
A política do Pacto de agressão e deste Governo ou os despachos do Ministro das Finanças destinam-se a um único objectivo: fazer pagar aos trabalhadores e ao povo por inteiro a crise do capital financeiro e especulativo.
Se as leis que temos não lhes chegam fazem outras, se a Constituição lhes trava o passo atropelam-na e se os tribunais os condenam em flagrante delito transferem para outros o cumprimento da pena.
Aqueles que há mais de 30 anos verdadeiramente mandam no país por intermédio de sucessivos governos não querem deixar de mandar. E vão fazer de tudo para continuar a mandar.
Atropelando a Constituição, arruinando a vida de quem vive do seu trabalho, negando educação ou refeições nas escolas, tratamentos nos hospitais ou prestações sociais porque o senhor presidente do conselho investido em Ministro das Finanças não deu despacho para realização da despesa.
Este Governo não se conforma com as regras da democracia nem com a Constituição que, apesar de mutilada, continua a consagrar um regime diferente daquele que em Portugal vigorou até Abril de 1974.
Este Governo não aceita a obrigação de cumprir a Constituição e procura agora criar a ideia de que os custos da recente decisão do Tribunal Constitucional são os que decorrem deste Despacho: um Estado paralizado, direito fundamentais dos cidadãos dependentes de decisões orçamentais do Ministro das Finanças, um verdadeiro estado de sítio não declarado.
Por isso este Governo tem de ser demitido.
Que não haja descanso. Que todos aqueles que continuam a ser alvo destas políticas se levantem contra este Governo, em defesa da Constituição e da democracia porque a sua defesa faz-se agora, porque há Constituição e democracia para defender.
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